Comunicar | Testemunhos
Por: João Pedro Freitas, 50 anos, Advogado e Empresário
OS MEUS ENCONTROS COM O KENJUTSU
Posso dizer o que o meu interesse pela Artes Marciais Japonesas começou com a curiosidade que desde os meus 7/8 anos me despertavam os objectos chineses que se vendiam numa loja na Avenida de Roma, a “Exótica”, que ainda existe.
Nessa altura, uma loja de produtos chineses despertava a curiosidade por uma civilização avançada, milenar, requintada e plena dos mistérios que o Boticário Tomé Pires se tinha aventurado a descobrir. A distância só aumentava a visão de grandeza do Oriente, no inverso da lei da perspectiva que determina a diminuição do tamanho do objecto observado com o aumento dessa distância.
Sempre que a minha Mãe comprava algo nessa loja, fundamentalmente objectos de decoração e uns pijamas de seda óptimos para o Verão, satisfazia-me esta curiosidade, respondendo às minhas perguntas sobre a China e o Oriente em geral que inevitavelmente lhe fazia.
A partir desse período fui-me apercebendo das diferenças entre as várias civilizações orientais, principalmente entre a China e o Japão; mais tarde tive uma visão clara dessa variedade, tão complexa quanto a da História Europeia, no fabuloso Museu das Civilizações Asiáticas que existe em Singapura.
É fácil compreender que deste interesse tenha nascido o contacto com as Artes Marciais. Quanto foi necessário escolher um desporto que desse uma compensação à mediocridade e ao tédio da “ginástica” do Liceu, escolhi o Aikido, que, em Lisboa, já funcionava no Ginásio Clube Português.
Na época, o significado do Aikido não totalmente compreendido por mim. Deixei-me mais atrair pela espectacularidade dos movimentos, com saltos e formas feitas pelo ar, do que pelo espírito que o Mestre Ueushiba lhe imprimiu. Mas mais tarde descobri que este tinha sido o meu primeiro encontro com o Kenjutsu.
A História das Artes Marciais, e refiro-me agora especificamente às Japonesas, está muito relacionada com a própria História deste País.
Como me ensinou o Mestre Inácio Dias, o período Meiji e a organização de um exército moderno que se concretiza neste tempo, introduzem uma profunda transformação na prática das Artes Marciais.
A proibição do uso dos sabres e a necessidade de se ensinar técnicas de combate a um grande efectivo de homens em pouco tempo, desenvolvem as designadas Artes Marciais externas, que têm grande visibilidade de movimentos que facilitam a aprendizagem.
Depois da experiência com o Aikido, pratiquei Karate; este é um exemplo elucidativo duma Arte Marcial externa e seria, também como mais tarde vim a descobrir, o meu segundo encontro com o Kenjutsu.
Após um interregno de alguns anos, resultante das exigências da vida universitária e dos primeiros tempos de afirmação profissional, reparei num anúncio no Holmes Place de um curso de sabre japonês.
Tratou-se de um acaso, mas daqueles que, afinal, resultam duma sincronia de acontecimentos que de acaso acabam por não ter nada, já que questões de saúde me “obrigavam” a praticar um desporto que me estimulasse e até, de preferência, me “viciasse”; verifiquei que afinal se tratou do meu terceiro encontro com o Kenjutsu, agora já uma forma expressa e oficial.
O curso era dado pelo Mestre Inácio Dias, já acima mencionado. Com as aulas que este Professor ministra, as práticas e as teóricas, tudo o que de Artes Marciais tinha feito até aí começou a fazer sentido.
Acabei por aprender que as bases do Aikido e do Karate, tal como de muitas outras Artes estão afinal na antiga e nobre arte dos Samurais, ou seja, no Kenjutsu. As técnicas tradicionais estão lá, pelo que a aprendizagem desta última leva-nos a descobrir a raíz da coisas e, consequentemente, a ser muito mais eficaz, sejam quais forem os nossos objectivos.
Como tradicionalista que sou, sempre entendi que a melhor forma de inovar e progredir é entender a natureza substancial da realidade tal como os Antigos nos transmitem. Isto acabou por confirmado com a prática do Jisei-do e do Tai-Chi, que fui motivado a fazer e que fazem todo o sentido em conjunto com o Kenjutsu.
Todas estas são Artes Marciais internas, nas quais predomina a activação dos pontos de energia que aparentemente não são visíveis, mas que permitem melhorias evidentes no equilíbrio orgânico e, consequentente, na saúde em geral.
Estou muito longe de entender os koans, que são perguntas aparentemente absurdas mas que encerram significados de longo alcance na compreensão das Artes cultivadas pelos Samurais e que eram por estes estudadas.
Mas a eterna busca do seu sentido escondido que a prática do Kenjutsu, do Jisei-do e do Tai-Chi permitem é um incentivo suficente para que 3 vezes por semana o meu estado físico geral melhore de facto.
João Pedro Freitas, Outubro de 2011.